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Palavra Andante


Caçador, ano 2213.

Peguei o metrô na estação Central Park (o antigo Parque Central). Optei pelo monotrem solar. Entrei. Havia, comigo, 49 pessoas no vagão, todos sentados. A maioria com algum tipo de dispositivo eletrônico nas mãos, olhos ou ouvidos. Na parede do vagão também havia telas com informações diversas. Quando o 50º passageiro entrou e se sentou, o vagão começou a se locomover. Logo deixou a luz do dia e mergulhou no subterrâneo. Acelerava pelo túnel. Em poucos segundos saiu das profundezas e novamente foi banhado pelo sol. Reconheci o local: estava no cume do Alto Bonito. Pelas janelas do monotrem a cidade se espalhava vale abaixo, brilhando na luz solar.

Desci na estação Alto Bonito e fiquei espantado. Estava tudo arborizado e muito limpo. Todas as construções tinham sido removidas e o local virou uma floresta urbana com Imbuias seculares e macacos divertidos. Tudo para preservar a paisagem deslumbrante. Aluguei uma baike solar e fui andando pela Ciclovia Florestal do Alto Bonito. Pedalar ali era quase como flutuar. CDR era uma metrópole. A urbe se estendia até o horizonte, ao pé do antigo morro das Antenas. O rio do Peixe reluzia como uma serpente de prata. Fui pedalando e decidi pegar o descidão do SENAI. Na rua quase deserta a bicicleta chegou a 85km/h e então uma voz feminina falou no GPS “velocidade máxima atingida, por favor diminua”. Fiz como a moça recomendou. Mas era uma tentação conduzir aquela bicicleta solar numa rua sem carros.

Lá embaixo encontrei uma rua verdejante e o Parque do Berger lotado com milhares de crianças e os mais diversos instrumentos musicais. Era o XXXV Encontro Musical das Escolas. Fiquei duas horas por lá admirando a música e a alegria dos pequeninos.

Perambulei pelo bairro e descobri que antigas fábricas se transformaram em novos empreendimentos, mais lucrativos: florestas medicinais, parreirais e centros de repouso e meditação. Turistas coreanos caminhavam pelos bosques, provando uvas. Embarquei num solarbus de superfície. O motorista sorriu, subiu o morro e dobrou na Salgado Filho. Devia estar a uns 200km/h quando entrou no túnel Júnior Cigano e, em instantes, o solarbus saiu no arborizado e esportivo bairro Martello.

Desci do solarbus no coração do Jung. Fiquei surpreso com a urbanização, a quantidade de escolas, as pessoas praticando yoga, esportes, dança e pintando quadros pelas alamedas floridas. Havia jardins orgânicos, hortas comunitárias interligadas a bosques repletos de passarinhos. Centenas de pessoas circulavam por ali, mexendo na terra, colhendo frutos, trabalhando nos pomares. Fiz um lanche num bistrô vegetariano, compartilhei outra bicicleta pública e pedalei pela Zona Leste.

Encontrei indústrias de ponta, silenciosas e limpas. Gramados extensos, feiras de arte, teatro de rua e nada de carros no caminho. Dei a volta lá por cima, no São Cristóvão, e logo cheguei ao Parque dos Monges, antigo trevo do Monge. Subi na torre dos Monges, compartilhei uma Asa Delta solar e sobrevoei a cidade. Uma paz infinita me acompanhou. Aterrissei no Parque Central.

Sentei num banquinho de pedra. Uma pequena flor amarela balançava devagar. Uma formiga subia em seu caule. Um senhor de barba e longos cabelos brancos, aparentando 95 anos passou deslizando num skate. Assobiava uma velha canção:

“Eu nasci há dez mil anos atrás e não tem nada neste mundo que eu não saiba demais...”

Rodrigo Espinosa Cabral


Rodrigo Espinosa Cabral

Rodrigo Espinosa Cabral, brasileiro, vegetariano, gremista. Um pedaço de poeira cósmica que, às vezes, escreve. Palavra Andante, um passeio pelo mundo das letras.

rodrigoec@gmail.com